A história de Pedro (nome fictício) ilustra o terror provocado pelo oxi, droga que está se espalhando rapidamente pelo Brasil. O oxi está sendo tratado pelos médicos como algo mais letal que o crack, considerado até agora a mais devastadora das drogas. Mas é consumido por pessoas que não sabem disso, porque é vendido em bocas de fumo como se fosse crack. O oxi invadiu os postos de venda tradicionais. Isso preocupa, diz o delegado Reinaldo Correa, titular da Divisão de Prevenção e Educação do Departamento de Investigações sobre Narcóticos (Denarc), da Polícia Civil de São Paulo.
A primeira apreensão confirmada do oxi em São Paulo ocorreu quase por acaso. Em março, a polícia apreendeu 60 quilos de algo que foi classificado como crack. O equívoco foi corrigido quando esse carregamento foi usado numa demonstração para novos policiais. Queimamos algumas pedras e, pelos resíduos, concluímos que era oxi, afirma Correa. Quase diariamente, a polícia de algum Estado do Brasil anuncia ter apreendido a droga pela primeira vez. Não é que o oxi surgiu em tantos lugares em tão pouco tempo. Ele já havia se espalhado sem ser notado.
Como o crack, o oxi é vendido em pedras que, quando queimadas, liberam uma fumaça. Inalada, em poucos segundos vai para o cérebro, provocando euforia e bem-estar. Visualmente, são quase idênticas, diz Correa. A diferenciação pode ser feita pela fumaça, que no caso do crack é mais branca, ou pelos resíduos: o crack deixa cinzas, enquanto o oxi libera uma substância oleosa. Por causa da dificuldade em distinguir uma droga da outra, é impossível ter exata noção da penetração do oxi entre os usuários. Sabemos apenas que ele está aqui há algum tempo, afirma Correa.
Recente nos Estados mais ao sul do país, o oxi é velho conhecido dos viciados da Região Norte. Acredita-se que a droga entrou no Brasil ainda na década de 1980, a partir de Brasileia e Epitaciolândia, cidades do Acre que fazem fronteira com a Bolívia. O consumo da substância foi registrado por pesquisadores em 2003, quando Álvaro Mendes, vice-presidente da Associação Brasileira de Redução de Danos (Aborda), pesquisava o uso de merla, outro derivado da cocaína, entre os acrianos. No primeiro momento, o oxi era usado pelas classes sociais mais baixas e por místicos que iam ao Acre atrás da ayahuasca (chá alucinógeno usado em cerimônias do Santo Daime), diz Mendes. A droga chegou à capital, Rio Branco, de onde se espalhou para outros Estados da região. Hoje, é consumida em todas as classes sociais, diz Mendes.

O agente penitenciário André (nome fictício), de 34 anos, morador de Rio Branco, no Acre, conhece bem os efeitos do oxi. Quem usa chama de veneno, diz. Como todo veneno, é traiçoeiro. André descreve o gosto da fumaça como algo gostoso. Pega mais, dá uma viagem. Não demora e surgem os efeitos adversos dor de cabeça, vômitos e diarreias. E paranoia. André diz que ouvia vozes. Era o demônio falando no meu ouvido. Os efeitos também são físicos. Via muitos usuários sujos de vômito e diarreia. Mesmo assim, André não conseguia abandonar o uso. Vendeu o que tinha para comprar pedras. Pedia aos boqueiros (quem trabalha nas bocas de fumo) que passassem na minha casa e pegassem tudo. Geladeira, fogão, DVD, um a um, todos os móveis e eletrodomésticos foram trocados por pedras brancas. Só não troquei a vida, diz André, que está internado numa clínica ligada a uma ONG em Rio Branco. Ele afirma que só buscou tratamento porque, desempregado, não tinha mais dinheiro para abastecer o vício.
É preciso que o serviço de saúde tenha exata noção das substâncias que compõem o oxi, a fim de entender seus efeitos e propor tratamento adequado. Por enquanto, faltam estudos laboratoriais que atestem a composição da substância. Na década de 1980, a Alemanha queria montar uma política para diminuir as mortes provocadas por overdose de heroína. Descobriu-se que o que estava matando era uma versão da droga com aditivos. Somente a partir dessa constatação o serviço de saúde organizou a melhor forma de tratamento. O Brasil suspeita, mas não tem certeza, do que é feito o oxi. Saber é o primeiro passo de uma longa batalha contra a nova droga.

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